domingo, 29 de novembro de 2009

em conexão orgânica com a liberdade




Imagem: ilustração de Rafael Nobre


"Expresso a mim e a ti os meus desejos mais ocultos e consigo com as palavras uma orgíaca beleza confusa. Estremeço de prazer por entre a novidade de usar palavras que formam intenso matagal. Luto por conquistar mais profundamente a minha liberdade de sensações e pensamentos, sem nenhum sentido utilitário: sou sozinha, eu e minha liberdade. É tamanha a liberdade que pode escandalizar um primitivo mas sei que não te escandalizas com a plenitude que consigo e que é sem fronteiras perceptíveis. Esta minha capacidade de viver o que é redondo e amplo - cerco-me por plantas carnívoras e animais legendários, tudo banhado pela tosca e esquerda luz de um sexo mítico. Vou adiante de modo intuitivo e sem procurar uma idéia: sou orgânica. E não me indago sobre os meus motivos. Mergulho na quase dor de uma intensa alegria - e para me enfeitar nascem entre os meus cabelos folhas e ramagens."


("Água Viva" - Clarice Lispector)

Um comentário:

Victor Jabbour disse...

Depoimento visceral de uma rainha, que vivia na transcendência total, no desapego desses valores vencidos que nos consomem. Mas, por isso, teve de sofrer...

E por quê não viver assim... né ñ?!