quarta-feira, 18 de março de 2009

Divagação

Pelos portões da vida

Penso vez ou outra como a vida e o futuro bailam desapercebidos diante de nossos olhos. Inacreditável como somos pegos de surpresa nas improváveis interações do dia-a-dia.

Nos tempos presentes, perambulo pelas imediações do Butantã. Seus traços urbanísticos desgastados revelam o descaso atual dessas terras. Isso até que resolvam transformá-lo em bairro alvo das especulações imobiliárias que já assolam os demais bairros vizinhos. E pensar que pouco antes me perguntava como seria a vida neste lugar, pois só conhecia a outra margem do rio. Toda essa conversa fiada para chegar no ponto da minha divagação.

Há algum tempo, quando em minha mocidade fazia estágio na Universidade de São Paulo, a única realidade dimensional existente era o famoso Portão 1. Pela própria hierarquia matemática da coisa, é o que podemos chamar de entrada principal daquilo que não tem um centro, especificamente falando. Chegadas e saídas se davam sempre por ali. Caminhos diários vivenciando sempre as mesmas diversidades teatrais: o posto de polícia, os antigos casarões, as meretrizes desse mundão e toda sorte de fauna e flora urbana da classe média.

Por qualquer razão, por um motivo que nem me recordo, um dia necessitei acessar outra rota de fuga. Saí, então, pelo denominado Portão 3, o “Portão da Veterinária”. Não menos importante, mas menos badalado, conheci um novo ponto de vista da velha realidade.

O bairro Butantã, para aquele meu momento de conhecimento, era avesso à paisagem palpitante do famigerado Portão 1. Vi botecos simplórios a mil, casas mais modestas, lojas de automóveis usados e as meretrizes – faça chuva ou sol, têm coisas que nunca mudam...

E meio às quebradas, curvas, muitos buracos, retornos e entornos, vi uma frota de carros mais castigada, agitada, contudo menos aflita ao retornar da “rush hour”. É outra percepção, outra convenção de ideias. Penso que a maior preocupação do “cidadão do Portão 1 “ é estacionar o carro em uma de suas 5 vagas de garagem, antes de uma partida de futebol e a cervejinha. Já a do “cidadão do Portão 3” é saber se o carro vai conseguir levá-lo ao seu destino longínquo, antes do nascer do sol do dia seguinte – ou de um colapso mecânico...

Em suma, é viver a rica realidade de dois mundos imiscíveis, tão contrapostos mas tão paralelos aos olhares cosmopolitas.

Bem ali, tal e qual manda o figurino deste teatro a céu aberto, separados por portões de desilusão...

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